Muito tenho pensado sobre as capacidades e dificuldades dos jovens trabalhadores do nosso país. No dia a dia na clínica, me deparo com questões existenciais de meus pacientes e orientandos.
Nos atendimentos clínicos o tema trabalho está sempre presente, uma vez que o trabalho é uma das formas de expressão de nossa identidade.
Nos atendimentos em orientação profissional (jovens e adolescentes ) percebo a grande pressão gerada pelas expectativas que giram em torno desse tema.
O trabalho é compreendido como atividade de transformação, dada a sua importância para a construção da sociedade, bem como para a vida e sobrevivência do trabalhador. E se constitui como direito fundamental uma vez que sem ele não há dignidade humana.
Mas a ideia de algo além do trabalho, do trabalho ideal, da construção de uma carreira, e da responsabilidade de cada indivíduo nesta construção, tem trazido mais e mais pressão para esta fase da vida : a juventude, que por si só já é desafiadora.
Quando falo em juventude, utilizo a juventude definida como período, idade, fase da vida, compreendida entre a infância e o desenvolvimento pleno do organismo.
A ONU (Organização das Nações Unidas) define o período da juventude entre 15 à 24 anos. Sabe-se que este período cronológico tem suas variações dependendo do país e cultura e em minha experiência entendo que esse período pode ser estender até 30 anos, mas este é um assunto para outro texto!
É intrigante que a definição da juventude, me traz a ideia de algo que não alcançou o completo desenvolvimento, indicando uma falta, um “lugar” nem cá, nem lá. Como se fosse um limbo. Não há no que se firmar ou consolidar, é a indicação de um tempo de espera e preparo para se tornar (algo ou alguém).
Então, em termo de trabalho, posso entender que é um período de transição entre a vida estudantil e a vida profissional, laboral.
Mas o objeto dessa transição são as próprias ações de produtividade e construção. Que se antes eram feitas na escola, no ensino fundamental e médio, agora, na fase transição a ação será direcionada para um fazer remunerado.
Porém o ambiente do trabalho é onde se transita relacionamentos, afetos e conteúdos psicológicos. Por isso continuemos a tratar o trabalho além da ação em troca de salário para o sustento.
Muitas ações têm sido tomadas para a melhoria das condições de trabalho, inclusive do trabalho do jovem e ainda há muito a se fazer.
Os profissionais da área de Recursos Humanos vêm se empenhando em cada vez mais proporcionar ambientes saudáveis e felizmente a saúde mental vem sido tratada de forma mais respeitosa mesmo que a passos lentos mas já tivemos avanços.
Assuntos como: burnout, assédio moral, discriminação de gênero, raça e religião já podem ser falados, entendidos e enfrentados.
Não distante das organizações muitos psicólogos clínicos têm se voltado para serviços como a Orientação Profissional e de Carreira e os estudos nessa área estão cada vez mais aprimorados.
Mas o que falta, para cuidarmos com mais atenção da saúde mental desses jovens profissionais? Talvez não tenhamos de imediato essa resposta e por isso proponho uma reflexão a fim de prestarmos mais atenção a este grupo tão vulnerável, justamente por estarem em desenvolvimento e ao mesmo tempo em transição do seu fazer e responsabilidade.
O adoecimento psíquico também está presente nesta fase: depressão, ansiedade, crises de pânico, estados depressivos, sentimento de vazio existencial, são termos que fazem parte do cotidiano do jovem e que nem sempre olhados como deveria. Justamente por ser a juventude uma fase em que se espera brilho, alegria e vida.
Mas se olharmos mais de perto, com uma lupa da empatia podemos enxergar como o jovem percebe essa transição.
A quantidade de informações que recebem.
A falta de pausa.
Necessidade de investimento na qualificação profissional.
Investimento na qualificação.
Pretensão estudar mais e mais.
Competitividade.
Falta de oportunidades por causa da inexperiência.
Necessidade em encher o currículo.
Necessidade da aplicação do conhecimento.
Desgaste pela sobrecarga de atividades ou pela falta de atividades direcionadas.
Autonomia.
Incertezas do caminho e escolha profissional.
Incertezas do mercado de trabalho.
Deparar-se com a vida real e não mais virtual.
Imposições pela Pandemia Covid 19: distanciamento social, morte, adoecimento.
E assim a pressão segue para este jovem profissional que continua na sua busca pelo que um dia ouviu dizer: Sucesso!
Num mundo de mudanças contínuas ele se vê perdido em si, no seu organismo e nas exigências de um mundo que não para, não dá pausa.
E depois do curso técnico, da graduação, da pós o mercado competitivo pode pedir desse jovem justamente o que lhe falta: a experiência.
As organizações, empresas, podem e devem ser um lugar de aprendizado, porém a que se preparar este jovem e não somente com cursos técnicos ou excesso de conteúdo, mas preparar para um autoconhecimento, para além das matérias básicas.
E isso se pode mudar através da reforma na educação incluindo, por exemplo, programas de orientação profissional em que são discutidos e vivenciados assuntos como vida, trabalho, carreira, profissões, pesquisas, jogos e atividades que levem a reflexão de que eles, os jovens, não estão sozinhos e que há um caminho possível para sucesso com os pés no chão, na prática, levando em consideração o significado individual do que é o sucesso. Sei que já existem programas que contém esta proposta, e muitos, mas ainda não chegam à todos.
Enquanto não for possível, cabe a nós, profissionais da psicologia e educação disponibilizar os serviços a favor de uma orientação profissional de qualidade e olhar para o futuro meta e não como objeto de desejo com soluções mágicas.
É preciso cuidar da juventude!!!